Ronda

Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza a Ipiranga e Avenida São João.
É que quando eu cheguei por aqui
Eu nada entendi
Da dura poesia concreta de tuas esquinas,
Da deselegância discreta de tuas meninas.
Ainda não havia para mim Rita Lee,
A tua mais completa tradução.
Alguma coisa acontece no meu coração
Que só quando cruza a Ipiranga e Avenida São João.
Quando eu te encarei frente a frente
Não vi o meu rosto,
Chamei de mau gosto
O que vi de mau gosto, mau gosto.
É que Narciso acha feio
O que não é espelho
E a mente apavora
O que ainda não é mesmo velho,
Nada do que não era antes

Quando não somos mutantes.
E foste um difícil começo,
Afasto o que não conheço
E quem vem de outro sonho feliz de cidade,
Aprende depressa a chamar-te de realidade,
Porque és o avesso do avesso,
Do avesso do avesso.
Do povo oprimido nas filas,
Nas vilas, favelas,
Da força da grana que ergue
E destrói coisas belas,
Da feia fumaça que sobe
Apagando as estrelas,
Eu vejo surgir teus poetas
De campos, espaços,
Tuas oficinas de florestas,
Teus deuses da chuva.
Pan Américas de Áfricas utópicas
Do mundo do samba
Mais possível novo quilombo de Zumbi,
Que os novos baianos passeiam
Na tua garoa
E novos baianos te podem curtir
Numa boa.

Paulo Vanzolini